A HERANÇA DE ULYSSES – Por Luiz Fernando Obladen Pujol
Este ano farão cem anos do nascimento de Ulisses Guimarães, considerado um dos maiores estadistas de nossa história. Talvez nunca sua ausência tenha sido tão sentida. Porém o peso da ausência tem a vantagem de forçar a lembrança, a memória e o respeito, e com isto podemos encontrar valorosas lições.
Hoje os brasileiros tem ido às ruas. Vão às ruas para combater a corrupção. Vão às ruas para defender seu voto. Para impedir a entrega do patrimônio público, seja aos corruptos, seja aos interesses externos. A verdade é que todos vão às ruas em busca de um futuro melhor, de um país melhor.
Não importa como se vestem, que dia vão, de que classe são, ou de que região: todos são brasileiros e como tal merecem respeito e devem ser ouvidos por seus representantes.
A surdez dos eleitos é um dos piores defeitos dos políticos, mas pior ainda é escutar unicamente os que lhes convêm. O diálogo com os que possuem opiniões contrárias é essencial a Democracia. Só não se deve escutar na Democracia, aqueles que são contrários a ela própria.
No Estado Democrático de Direito, os eleitos que se revelam o avesso daquilo que estampavam antes da eleição surpreendem alguns, mas, mais surpreendente é o político que eleito passa a ser contra eleição, este é mais perigoso. O político que teme eleição ou não respeita o resultado da votação, não gosta do povo e do país, é contra a Democracia.
E não é somente na eleição que se deve ouvir a população; na formulação e execução das políticas e leis também se deve escutar o povo.
Entretanto, plebiscito e referendo se tornaram figuras decorativas em nosso país, tamanho o medo que os governantes têm de se deparar com a opinião popular. Audiências públicas formais ou reservadas à juristas são deturpações risíveis do que se entende tanto por público como por audível. O uso intensivo das polícias para afastar manifestações pacíficas de deliberações ou votações nas casas legislativas rompe a relação entre titulares e exercentes do Poder.
Distanciamento e falta de diálogo são os elementos que representam o núcleo da verdadeira crise, ao menos sua face institucional, desta crise política vivenciada nos últimos vinte anos.
O que completa a tríade da crise política brasileira é o desinteresse: a falta de comprometimento real (de aprofundamento, análise, estudo) diante de questões e temas políticos, o interesse sazonal ou momentâneo da maior parte da população sobre a Política e o que fazem os políticos. Isto é um erro, um hábito que deve ser revisto. A Política deve ser respirada, não visitada.
Ulysses já alertava para tudo isto, alertava para a necessidade de se interessar pela política, dizendo que “quem não se interessa pela política, não se interessa pela vida”. Sua vida política foi um exemplo da importância do diálogo e de se escutar os interesses conflitantes, com tal atitude galgou êxito em conduzir os trabalhos da Constituinte. As articulações de Ulysses Guimarães para driblar as intervenções autoritárias e pacificar discussões nos mais diversos temas na Constituinte beiram a milagres. Outra marca da trajetória política e da vida de Ulysses, foi o repúdio ao regime militar, afirmando que a ditadura merece apenas o nojo.
A posição que ele ocupou ao estar presidindo a Constituinte – o agente do Poder Constituinte Originário – lhe conferiu uma perspectiva do Brasil, um ângulo de nosso país impossível de ser repetido ou simulado. A visão que tinha diante de si no lugar em que ocupou historicamente foi única.
Mas Ulysses morreu. Não há hoje um político como ele e não irá surgir outro tão cedo, se algum dia surgir.
No entanto, ao relembrar sua importância e de suas lutas, resta claro que Ulysses Guimarães deixou conselhos e avisos para todos os brasileiros. Uma mensagem em especial se destaca e pode ser resumida em uma de suas mais conhecidas frases: “a Constituição é a luz”.
O que aflige os cidadãos brasileiros há anos e a cada eleição é o medo do retrocesso (político, econômico e social) apreensivos que estão com figuras sombrias sucessivamente ocupando e rondando os parlamentos e os palácios em todas as esferas. E a origem desta aflição é exatamente essa: já se espera que venha o pior daqueles que não dialogam, que não se aproximam, que não se conhece ou se desconfia.
A única garantia do povo face aos Poderes, ontem, hoje e amanhã é Ela: a Constituição Federal. Enquanto Ela estiver no ápice, pairando acima dos Poderes Constituídos, haverá Democracia e esperança.
Devemos respeitar e defender a Constituição, mesmo que os gestores não a respeitem, os legisladores queiram colocá-la de lado, os juízes não a defendam, o Ministério Público e a Defensoria fiquem inertes, a Ordem dos Advogados lhe dê as costas, os procedimentalistas gritem e os pragmaticistas esperneiem. Cada cidadão brasileiro deve exigir que estas vozes respeitem e defendam à Constituição.
Devemos respeitar e defender a Constituição. Recorramos a ela. Impeçamos que seja desvirtuada. Todo cidadão brasileiro deve estar atento para qualquer alteração constitucional, seja textual ou de interpretação. Somente assim estaremos honrando as lutas de nossos antepassados. Ela é o nosso escudo e a nossa espada.
Todo cidadão brasileiro deve respeitar e defender a Constituição. A Constituição é o Brasil. Defender a Constituição é Defender o Brasil!
Devemos atentar para o eco histórico da fala de Ulysses: “a Constituição é a luz”.
E estejamos atentos à herança de Ulysses! Seu exemplo de vida política. Não devemos buscar heróis ou salvadores. Devemos sim, todos nós cidadãos brasileiros, em um esforço diário e deixando de lado interesses egoísticos: dialogar, escutar, repudiar qualquer forma de autoritarismo ou ódio e acima de tudo Defender a Democracia !
Luiz Fernando Obladen Pujol
OAB/PR 68.526
Curitiba, 10 de Maio de 2016