REQUIÃO LANÇA A IDEIA DE UM CONGRESSO NACIONAL DOS BRASILEIROS PARA TIRAR O BRASIL DOS BANDIDO

 

 

 

Em um pronunciamento no plenário, nesta quinta-feira, 29, o senador Roberto Requião lançou a ideia de se convocar um congresso nacional de todos os que desaprovam o Governo Temer para debater e aprovar um programa comum de ação para resgatar o Brasil da greve crise econômica e moral que sufoca o país.
Requião mostrou que enquanto a Europa destrava a língua e espinafra o neoliberalismo, o Brasil, com um governo, abraça todas as teses de austeridade, impondo arrocho salarial, desemprego, reformas criminosas, taxas de juros lunáticas, venda do patrimônio público aos estrangeiros, ao mesmo tempo em que se chafurda na corrupção.
A seguir: vídeo e texto com o pronunciamento do senador.

TEXTO DO DISCURSO
Ulrich Beck, o sociólogo alemão da teoria da “sociedade de risco”, destacava a assimetria entre poder e legitimidade.
Do lado do capital e dos Estados, dizia ele, temos um grande poder e pouca legitimidade; do lado de cá, dos que protestam e se opõem, temos elevada legitimidade e pouco poder.
E completava: se os que detém o poder não têm legitimidade, não há como falar em democracia.
Beck referia-se à União Europeia, a Europa pós crise de 2008/2009, face as políticas de austeridade adotadas e que puniram especialmente os países do sul do continente, com destaque a Portugal, Espanha e Grécia, em um primeiro círculo infernal.
França e Itália, em um segundo círculo de fogo.
Para o sociólogo alemão, as políticas impostas ao continente pelo Banco Central Europeu, para proteger o sistema financeiro, tiravam definitivamente a legitimidade da Europa neoliberal, por causa de consequências como desemprego, redução dos salários, aumento da pobreza e da desigualdade.
Além da exacerbação da xenofobia e do fundamentalismo religioso.
Assim, não é à toa que Beck vai acrescer à sua “teoria da sociedade de risco”, os riscos econômicos, especialmente aqueles decorrentes da globalização financeira, que vão ameaçar gravemente a democracia.
É bom se ressalve que Ulrich Beck estava falando de democracias consolidadas, as democracias europeias, em tese regimes com instituições sólidas, mas que ele deslegitimava por entregarem o comando da economia, e de toda a vida nacional, ao Banco Central Europeu, ao Fundo Monetário Internacional e à Comissão Econômica Europeia, isto é, ao mercado financeiro.
Se, na Europa, um dos principais sociólogos do pós-guerra, questiona a legitimidade dos governos que cederam às imposições do mercado financeiro, o que falar da legitimidade de um governo brasileiro que nasceu de um golpe da tríplice aliança entre o mercado, a mídia e o parlamento?
Logo, com esse vício de origem, liminar, não há qualquer licitude nas iniciativas desse governo, especialmente nas propostas de reformas trabalhista e previdenciária.
Dias desses, o presidente do Banco Central usou os jornalistas de mercado para mais algumas daquelas declarações patéticas, constrangedoras.
Quem é que deu legalidade ao mandato dele? Como é possível que esse senhor mande no país e imponha arrocho, recessão, desemprego, dependência e miséria? E sobre o que ele falava? Metas de inflação. Inacreditável! A economia exangue, dessangrada e o cujo vem falar sobre as metas de inflação!
Há algum outro exemplo tão acachapante, esmagador como este da distância entre o Brasil e o governo?
Temos aqui, de forma axiomática, ostensiva o que Beck caracterizava como “assimetria entre poder e legitimidade”.
Ulrich Beck, Boaventura de Souza Santos, Salavoj Zizek e tantos outros sociólogos e filósofos europeus, especialmente depois que o mercado financeiro, na sequência da crise de 2008/2009, com a aprovação dos Estados da União Europeia enfiou goela abaixo de países e povos políticas de austeridade, esses pensadores perderam de vez a paciência com os governos do Velho Mundo. Especialmente com aqueles governos que se tingiam de socialistas ou socialdemocratas.
Temos, por exemplo, o português Antônio José Avelãs Nunes, já quase octogenário e um dos mais brilhantes pensadores contemporâneos a citar como epigrafe de uma entrevista pichação anarquista em sua Coimbra que dizia:
“Só não há revolução porque não há revolucionários. Motivos não faltam”.
Enfim, jovens ou velhos, sociais-liberais ou anarquistas, não há mais paciência, não se tolera a dessimetria entre as aspirações nacionais, populares e democráticas e os governos formalmente constituídos, quanto mais aqueles de origem golpista.
Diz-se que a abstenção recorde nas eleições legislativas francesas, tanto no primeiro como no segundo turno, especialmente neste, o que levou a uma vitória estrondosa do governo, deveu-se ao desencanto inicial do país com o recém-eleito presidente Emmanuel Macron, cujo primeiro ato depois empossado foi ir pedir a benção da Alemanha.
A Alemanha de Merkel, hoje, mais uma vez, a senhora da Europa.
E não se tratou de uma visita de cortesia à senhora Merkel. Foi a visita da Europa de Vichy, a Europa colaboracionista à Europa Alemã, atacou Avelãs Nunes.
Como se vê, os intelectuais europeus destravam a língua e deixam de lado as mesuras para mostrar a situação limite a que se chegou no continente com a prevalência do sistema financeiro sobre o emprego, os salários, as garantias e direitos sociais, o bem-estar, a segurança e a ventura de vida, e a democracia.
Repito Ulrich Beck, para pousar as minhas preocupações no Brasil. “Se os que detém o poder político não têm legitimidade, não é possível falar em democracia”.
Isso posto, a pergunta inevitável: que fazer?
Está assente, firme e estabelecido a falta de legitimidade do governo brasileiro.
E, por consequência, das medidas que dele emanam. Isso é indisputável.
E essa ilicitude agrava-se quando o governo, além da absoluta rendição ao mercado financeiro, sujeita-se também a nações estrangeiras, abrindo mão da soberania nacional sobre os minérios, o petróleo, as terras, os ares, as florestas, os mares e a defesa nacional.
A cessão da base de lançamentos de foguetes de Alcântara aos Estados Unidos e o desmantelamento do projeto do submarino nuclear, sob inspiração e intervenção direta do Departamento de Estado norte-americano, com a colaboração entusiasmada de alguns promotores e juízes de primeira instância, são dois pequenos exemplos do imenso entreguismo desse governo de bandidos.
Aliás, o banditismo e o entregusimo têm uma longa e vergonhosa tradição na América Latina, e sempre caminharem de mãos dadas sob a proteção imperial.
Voltemos à pergunta: o que fazer?
O lançamento da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Soberania, que fizemos na quarta-feira, dia 21, é um belo passo.
É bem verdade que estamos ainda na esfera da propaganda, entendendo por propaganda a clássica sistematização de Plekhánov, que a definia como a circulação de muitas ideias, para a apreensão de poucas pessoas; sendo agitação a circulação de poucos ideias, condensadas, sintetizadas para o consumo das grandes massas populares.
Consoantes com que o que veicular, porque ajustados quanto aos pressupostos do que pensamos, precisamos agora alcançar os quadros superiores e médios da sociedade brasileira e, em seguida, agitar, informar e mobilizar as grandes massas.
Relembro aqui Afonso Arinos de Melo Franco.
No aceso da crise provocada pelo chamado segundo choque do petróleo, no início dos anos 80, tínhamos um país convulsionado pelo desemprego, pelo arrocho salarial, pela corrosão do poder de compra, pela inadimplência, pelo êxodo rural, pela favelização e pela pobreza.
O velho udenista, com a sua vivência octogenária, vendo aquela barafunda toda em que se esvaia a ditatura militar, disse que o governo deveria agradecer aos céus não haver no país um partido bolchevique e, mais ainda, não haver um Lenin à frente desse partido, porque estavam dadas todas as condições para uma revolução no Brasil.
A realidade brasileira hoje não é tão diferente daqueles anos inaugurais da década de 80. Assim, de certa forma, os citados anarquistas de Coimbra repetem o tocador de violino da banda de música. De fato, motivos não faltam.
Por favor, entendam. Não estou pretendendo colocar a Revolução na ordem do dia.
E longe de mim retomar aqueles tediosos debates sobres as condições subjetivas e as condições objetivas.
O que eu quero dizer é que precisamos não apenas convocar, agitar e mobilizar os brasileiros. É preciso organizá-los.
Assim como é preciso unificar as tantas organizações, sindicatos, associações, coletivos, frentes que, em hipótese, opõem-se não apenas ao governo e sim às classes dominantes, as classes que representam os grandes capitais nacional e estrangeiro, a banca, o capital financeiro, a globalização financeira.
Mas não bastam que mil flores desabrochem que cem escolas de pensamento se rivalizem, é preciso ir além da poesia maoísta, é preciso organizar, unificar essa miríade de ideias, iniciativas e coletividades que brotam, espocam em todo o país.
Em uma entrevista à Folha de S.Paulo – como se vê, às vezes, dá para ler a Folha- Boaventura de Souza Santos, fala sobre a “geringonça” que os portugueses engendraram para tirar o comando do governo da direita.
“Gerigonça” foi o termo depreciativo com que a direita classificou a união das esquerdas e do centro esclarecido para resgatar Portugal das políticas de austeridade impostas pela troika, a serviço do capital financeiro.
E a “gerigonça” está dando certo.
A economia portuguesa é uma das que mais cresce na Europa, cai o desemprego, retomam-se os investimentos, reforçam-se a educação e a saúde públicas. O pequenino Portugal dá um exemplo ao mundo.
Precisamos nós também montar a nossa “geringonça”.
Precisamos reunir sob um mesmo guarda-chuva todas as manifestações de insatisfação.
Lanço aqui a ideia de um congresso nacional de todas as forças que reconhecem e se opõem à ilegitimidade deste governo, pois se os que detém poder não têm legitimidade, não há como falar em democracia.
Ora, o Brasil não pode continuar tolerando um governo ilegítimo, que é rejeitado por 93 por cento da população, que atua à margem da lei, contra a Constituição, um governo de bandidos e de agiotas, nacionais e internacionais.
Um governo que, mesmo assim, com a sustentação de bancadas parlamentares fisiológicas, de negocistas e trapaceiros, e de serviçais da banca, consegue fazer aprovar, com a rejeição quase unânime e dos brasileiros, as mais duras punitivas medidas contra os trabalhadores.
Lanço a ideia de um congresso nacional, a fim de unificar um programa mínimo para a oposição e para unificar as frentes e organizações dos que se opõem.
Do lado do capital e do Governo temos um grande poder e pouca legitimidade; do lado de cá, dos que protestam e se opõem, temos elevada legitimidade e pouco poder.
Vamos, portanto, fazer valer a legitimidade nacional, popular e democrática.